o sim e o não, o alfa e o ômega, o homem e a mulher, a langue e a parole, o yin e o yang.

10 setembro 2015

Esquerda x esquerda

Mas a questão decisiva é qual sistema estamos querendo derrubar – ou, ainda, que sistema queremos colocar no lugar? Na França Napoleônica, ser de esquerda era se opor à monarquia; no socialismo do século XX, estar à esquerda era ser contra o capitalismo. Só que já nessa época já se discutia o que ia ser colocado no lugar; ou, antes disso, como faremos pra derrubar o grande capital.

Meus amigos de facebook são, em sua maioria, de esquerda; mas isso não quer dizer que todos têm a mesma concepção de esquerda; nem que eles concordem na maioria de seus pontos. Pode-se dizer que todos têm como ponto comum que o lucro não deveria estar sobre o interesse coletivo. Mas acho difícil dizer que todos eles são anticapitalistas – assim, com todas as letras.

Mesmo aqueles que são contra o Capital – aqueles que leram Marx e tal… mesmo eles não tem em comum o modus operandi da derrubada de poder. Alguns acreditam na ruptura, na revolta armada; outros acreditam numa transição, longa e dolorida, no dia a dia, até que o sistema se esvaia. E, mesmo assim, depois que o capitalismo estiver derrubado, não há um consenso sobre o que deve existir no lugar; socialismo, comunismo, anarquia, anarco-socialismo, anarco-comunismo, anarco-cristianismo, anarco-capitalismo (?), et cetera.

E, além disso, se a esquerda são os opositores do sistema, convém definir o que é o sistema. Ora é o Capital o grande mal? mas e as outras opressões? O capitalismo divide as pessoas entre as que detêm o poder e as que são exploradas (e ainda as marginalizadas, que nem sequer têm acesso ao sistema). Há outros sistemas de opressão paralelos, subjacentes ou permeados ao capitalismo; as coisas ficam mais fáceis para quem é humano, rico, do sexo masculino, branco, heterossexual, cisgênero, letrado, sem deficiências físicas ou mentais, e/ou detentor de algum outro privilégio que não mencionei ou sequer sei que existe.

Há esquerdas que acreditam que o capitalismo é o mal maior e que se ele deixar de existir todos os outros problemas somem; ou aqueles que acreditam que os problemas devem ser tratados um de cada vez, a começar pelo capitalismo. E há a esquerda que acredita que todas as formas de opressão devem ser combatidas, uma a uma. E todos os nuances possíveis de o que é considerado uma pauta de luta.

Tentar definir tudo isso mostra que, sem dúvida, o rótulo de “esquerda x direita” é bastante vago. O que não significa de maneira alguma que devamos deixar de usá-lo. Embora não haja uma unidade dentre os participantes desse grande balaio da esquerda, há ainda a clara distinção entre os que acreditam no sistema e os que lutam para derrubá-lo.

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